A
palavra Liturgia, é uma palavra demasiado pequena para ser definida e descrita
toda a beleza da ação que nela existe. Em traços muito gerais, a liturgia
trata-se duma celebração e pressupõe-se de diferentes modos e contextos
cerimoniais, por exemplo, Liturgia das Horas à qual presenciei, com muito
agrado, no Mosteiro de Singeverga, Liturgia da Palavra, os Cânticos de Laudes e
entre outras celebrações, ou seja, é no fundo, um modo de viver Deus
acompanhada de ritos, gestos, envolvência total humana no culto da Santa
Igreja que convoca, cria um elo de ligação
que nos conduz através da Palavra, à relação e comunicação com o Criador –
Deus, Pai.
O capítulo que me foi convidado a
ler e interpretar do autor Romano Guardini – “O Espírito da Liturgia”, Cap.
V - a Liturgia considerada como um jogo, de facto, interpretado numa
perspetiva mais ampla, tendo em conta o espaço celebrativo e o tempo que nos é
vindo e trazido pela Tradição, o jogo é visto nesta relação com Deus através de
diferentes modos de união em que o objetivo é participar em qualquer das suas
partes porque qualquer uma nos conduz até ao Pai, ninguém fica de fora e
ninguém perde, bem pelo contrário, encontramo-nos, reavemo-nos e ganhamos por
isso. Permitindo a expressão, jogar com Deus, é ir ás origens como é referido e
desejado pelo Concílio Vaticano II, é saber como e onde O encontrar, lidar e se
relacionar por meio da entrega verdadeira e espontânea do nosso ser, e tal só é
possível se nos deixarmos mover, se nos deixarmos entrar no jogo, se realmente
formos como as crianças – puras e espontâneas como quem se vira e corre para a
Mãe. A Liturgia permite-nos entrar no jogo do amor onde Deus não se cansa de
Seus filhos, nem desiste de nos chamar por diferentes modos e contextos
litúrgicos. O espaço sagrado é o lugar privilegiado onde Deus se revela para
nós, desperta os nossos sentidos por intermédio da Liturgia sem excluir ninguém
nem qualquer uma das partes, pois a Liturgia é inexaurível como um mundo de
vida que se apoia sobre si pois a sua razão de ser é Deus.
O Homem possui todas as faculdades
necessárias que nos permite chegar perto de Deus e tal se verifica desde do
Antigo Testamento, o desejo de restabelecer a nossa ligação com o Criador.
A arte não fica de fora deste espaço
nem desta temática, porque há intenção e mensagem do autor em que se contemple
e se deixe participar e transpor nesse tempo e espaço, que hoje é possível ser
vivido à luz da Tradição, daí a importância irmos ás raízes, logo Deus
permanece ainda hoje no nosso seio e vive desde sempre na nossa vida. Somos nós
que muitas as vezes nos separamos d´Ele, e em consequência disso, a prudência
da idade adulta como que tudo tem um fim e que nada é permanente, não entramos
nesta harmonia entre a transcendência e imanência, logo nos afastamos do plano
salvífico de Deus, não entramos no jogo do amor e em ultima análise, ficamos
longe de entender que Deus se estende ao homem através da Liturgia, que está
mais perto de nós mais do que conseguimos imaginar.
Quando
falamos em Liturgia Romana, leva-nos sem querer a tentar perceber o modo como
Roma se coloca geograficamente no centro da vida Cristã. De facto, foi em Roma
que os Apóstolos Pedro e Paulo morreram, mas de que modo se tornou tão
relevante e marcante?
Foi em Milão que se deu por
determinado e terminada a perseguição aos Cristãos sob a complacência de
Constantino, ano 313 (Édito de Milão), o motivo pela qual se deu o término,
crê-se que o imperador tenha ganho uma batalha sob a intercessão ao Deus dos
Cristãos e tenham ganho alguma benevolência a partir daí e por essa razão.
Nesta altura, à qual os Cristãos poderiam professar e confessar com alguma
liberdade a sua fé, há uma necessidade também de proteger e zelar tudo aquilo
que guardavam, não só a instrução de nosso Mestre, Nosso Senhor Jesus Cristo,
como também, alguns livros de caris litúrgico importantes e também outros
livros que funcionaram como apêndice ao Cristianismo. O Importante é também
realçar os Livros Sacramentários, que eram aqueles livros que continham orações
e eram recitados nas missas pelo celebrante, Veronense (apanhado de orações,
recitações mais antigas provenientes dos arquivos de Latrão), Gelasiano (Livro
dos Sacerdotes) e o Gregoriano (livro do Papa).
Para tal, os Teólogos da época
decidem que a Liturgia Romana Pura deveria de gozar das seguintes
caraterísticas: Ser Breve, Simples, Sóbria e Prática. De facto, a
intenção é realmente boa dado que nos possibilita ficar na nossa memória, sendo
breve, descreve uma mensagem, um acontecimento, uma verdade em poucas palavras,
revelando o mais importante. Sendo Simples torna-se bela e pura, é Sóbria
porque não nos deixa dúvida, bem pelo contrário, penetra nosso ser como se nos
pertencesse. Prática porque se coloca na nossa vida, não se esgota, é
inexaurível. Apesar de tudo, passa a ser considerada Liturgia Mista/Contaminada
quando se fundiu rapidamente com outras comunidades como por exemplo, Germânia
(octos - Alemanha) , os Galicanos (França), Liturgia Ambrosiana (Milão), e no
ano 950 é quando nos deparamos com a introdução de acontecimentos que acharam
importantes e pertinentes colocar sob a Liturgia Romana Pura. Por este motivo,
conseguimos distinguir os modelos e as diferenças entre ambas, que não tinham
as mesmas caraterísticas pois eram o oposto, eram longas, excessivas e até
mesmo dramática comparativamente com a Liturgia Romana Pura.
Os três tipos de Missa
posterior às perseguições (Séc.III), são diferentes formalmente, porém com
conteúdos muito próximos umas das outras. São elas, a Missa Estacional (Stacio),
a Missa com um grupo menor e Missa Presbiteral.
Começando pela primeira, pela missa
estacional, era realizada pelo próprio Papa que anunciava o lugar para a
celebração eucarística mas o ponto de partida era numa Igreja relativamente
próxima da pretendida, o que nos faz pensar e nos faz lembrar quando Jesus
entra em Jerusalém e é acolhido pelo povo com ramos das palmeiras a abrir e a
dec(orar) o caminho, a verdade e a vida, era de facto o reconhecimento da vinda
do Messias, o cumprimento da profecia «Regozija-te muito, filha de Sião; solta gritos de júbilo; filha de
Jerusalém; eis que vem a ti o teu rei, justo e vitorioso; ele é simples e vem
montado num jumento, no potro de uma jumenta.» (Zac9-9)
Na
Missa, todos participavam, escutavam a palavra, ofereciam as oblações,
comungavam sob as duas espécies o corpo e sangue do Senhor, havia, portanto,
envolvimento pessoal quer na entrega à súplica Eucarística, quer também à
aderência ao Cristianismo que estava apenas a começar a desabrochar e a
desenvolver-se. Dentro desta simplicidade já era reconhecida e vista a beleza
da cerimónia, que nos aproxima do amor salvífico de Deus.
Relativamente à segunda missa, de
grupo menor, faz-nos lembrar aquando na época das perseguições, os primeiros
Cristãos, se organizavam e se encontravam nas casas urbanas, de modo a
acolherem e receberem o maior número possível de pessoas, chamadas nas Domus
Eclesiae e celebravam ali mesmo, adequando assim as divisões da própria
casa ao contexto e espaços sagrados da Igreja. Algumas partes dessas casas
foram desabadas devido a causas naturais e em outras circunstâncias, a guerras.
Contudo, existem partes que foram preservadas e ainda hoje mantemos viva essa
memória dos primeiros Cristãos, que apesar de tudo mantinham-se fiéis e se
encontravam em nome do Senhor. Á semelhança desse tempo a missa presbiteral era
constituída por um certo grupo de pessoas que se reuniam por várias razões, mas
agora de um modo livre.
Por último, temos a Missa
Presbiteral, não tão contemporânea quanto o nome de presbitério que nos é de
algum modo familiar, só que era celebrada com o Sacramentário e o Lecionário
livremente pelo sacerdote, acompanhado de um diácono ou por outro ministro
leitor. O contexto da missa não era algo planeado, simplesmente se contemplava
o mistério da graça de Deus e é introduzido aqui, o Kyrie (ato
penitencial), cânticos antifonais, o Agnus Dei que é uma expressão de
referência a Jesus Cristo aquando o sacrificado na Cruz, o Glória e o Credo –
símbolo dos Apóstolos.