De facto, pelo testemunho dos autores sagrados, Israel pode crer que o seu Deus queria a sua salvação e também conhecer os seus caminhos.
Nestes escritos podem ser consideradas três classes de elementos, que os cristãos sabem perfeitamente que se cumpriram em Jesus Cristo
1- o conhecimento do verdadeiro Deus que se distingue dos demais deuses e dá um fundamento à esperança de Israel.
2- experiência da vontade salvifica do seu Deus que Israel, no decurso da sua história, experimentou no meio dos outros povos.
3- as diferentes formas de mediação com as quais se promoveram continuamente a observância da Aliança e a comunhão entre Deus e os homens.
DEUS E A SUA REVELAÇÃO NO ANTIGO TESTAMENTO
Segundo o livro da Sabedoria, pensava-se que as potências, as coisas belas deste mundo, provinham dos deuses, desconhecendo que o seu criador era muito mais atractivo. Mas Deus da-se a conhecer a Israel buscando Ele próprio os homens: chama Abraão, e concede-lhe uma descendência que se converterá no próprio povo particular de Deus, entre todos os povos da terra, e de um modo inteiramente gratuito. Em Abraão e a sua descendência, as nações da terra receberam a sua benção. Só neste Deus encontraram a Salvação e deverão encontrar só nele a esperança.
Deus, criador de todas as coisas, da-se a conhecer a Israel, sobretudo como Senhor e Moderador da História. Não há outro Deus senão em Israel. Ele é único. De uma maneira especial se mostra como Rei, ainda que já tenha manifestado a sua autoridade real na sua forca criadora a desvela ainda mais, tendo cuidado da sorte de Israel e do seu futuro. Esta autoridade real alcançará um lugar destacado no próprio culto, que se tributa a Deus em Jerusalém. Quando Israel escolheu para si próprio uns senhores e por isso teve de suportar o pesado jugo daqueles reis, então achou em Deus o Bom Pastor, porque Ele é sempre fiel.
Portanto Deus, na medida em que esta próximo dos homens, constitui a própria substancia da fé de Israel; o seu nome próprio, representado no tetragrama YHWH, é a confissão da sua fé, e ao mesmo tempo, define a forma das relações que Ele quer iniciar com o seu Povo, chamando-o à fidelidade.
DEUS E OS HOMENS : PROMESSA E ALIANÇA
Deus pactua uma aliança com os homens que formam um povo. À frente desse povo pôs uns chefes: Abraão, Moisés, "Juízes", e Reis. Por meio das suas façanhas, Deus livraria o seu povo de toda a escravidão ou domínio estrangeiro, lhes daria a Terra Prometida e lhes proporcionaria a salvação. Além disso, por meio das suas leis, cuja observância tinha que ser para Israel a forma peculiar de confessar a sua fé em Deus, assegurando o respeito em relação à pessoa do próximo e aos seus bens.
É sabido que o povo e os seus chefes se submeteram livremente a esta aliança que Deus decidiu estabelecer entre Ele próprio e os Homens. Mas o Povo de Deus, sempre se viam incitados pela tentação de prestar culto a outros deuses além de YHWH, de oprimir o próximo com toda a classe de injustiças, de romper desse modo, a "Aliança" feita com Deus.
Com toda a fidelidade, Deus vencerá e infidelidade dos homens , selando com eles uma Nova Aliança, uma aliança perpetua e que não se rompe. Essa aliança se estenderá não só à posteridade de Abraão, por meio do sinal da Circuncisao , mas também a todos os homens por meio do sinal do arco-íris do céu.
Os profetas denunciaram o escândalo da violação múltipla desta Aliança, de que eram testemunhas; tal era o motivo pelo qual o povo eleito por Deus foi condenado. Os profetas converteram-se nas principais testemunhas da fidelidade, sobretudo do próprio Deus, que superaria todas as infidelidades dos homens. Pois o mesmo Deus transformaria o coração do homem, fazendo-o capaz de cumprir satisfatoriamente as suas obrigações pela obediência à Lei.
Com efeito, Deus, por meio de David, tinha cumprido as promessas anteriores, com as quais se havia comprometido a formar das diferentes tribos o povo livre de Israel na sua própria terra. Ainda que os sucessores de David quase nunca seguissem os seus passos, os profetas, sempre esperaram "aquele Rei" que, como David, administrou a justiça e o direito a todo seu povo, sobretudo para os mais pobres e mais débeis do reino.
Além disto, os profetas anunciam que a cidade de Jerusalém há-de ser purificada e restaurada, onde Deus habitaria o seu templo.
Capitulo II: O cumprimento das promessas de salvação em Jesus Cristo
A pessoa e a missão de Cristo
Jesus de Nazaré, nascido de uma mulher, sob o domínio da Lei, veio na "plenitude dos tempos" para "dar cumprimento à esperança de Israel". Segundo as suas próprias palavras, pela pregação do Evangelho feita por Ele completou-se o tempo e o reino se Deus está próximo. Na sua pessoa , o Reino de Deus está entre nós. Os milagres e as obras poderosas, realizadas por Ele mediante o Espirito de Deus, mostram que o reino de Deus chegou. Jesus veio não para revogar a Lei ou os profetas, mas leva-los à perfeição.
Não obstante, este cumprimento não pode ser concebido de forma semelhante à que os homens daquele tempo obtínhamos leitura da Sagrada Escritura. Convém avaliar cuidadosamente o testemunho dos Evangelhos. Estes procedem dos discípulos de Jesus, aqueles que ouviram e escutaram as palavras do Homem-Deus, aqueles Evangelhos que nos chegaram por eles por intermédio do Espirito Santo.
A sua acção não só cuidou de que essa transmissão se fizesse fidelidade; ainda mais, deu lugar a que, passado o tempo, por meio da consideração atenta dos autores sagrados fecundada por Ele, surgisse a tradição dos actos e dados acerca de Jesus, numa medida mais abundante e mais desenvolvida.
A partir dai se explicam a variedade e a diferença dos modos de escrever, das opiniões e do vocabulário que, por exemplo, se percebem entre os Evangelhos Sinoticos e o Quarto Evangelho. Quando a memória e a compreensão das palavras e actos de Mesus alcançaram a sua maturidade, na primitiva comunidade apostólica, guiada pelo Espirito de Deus, os Cristãos aceitam com razão esses modos diferentes de anunciar Jesus e a sua mensagem, segundo os diferentes níveis de desenvolvimento, com uma fé firme, comemorava autentica de Deus, confirmada pela autoridade da Igreja.
COMO SE REFERIU JESUS À TRADIÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO?
Não surpreende que Ele próprio aceitasse os títulos de Mestre e de Profeta ; mais ainda, atribui-se o ultimo a si mesmo. Ainda que rejeite ser considerado rei e Messias em sentido terreno, não repudia contudo o nome de filho de David. Aparentemente, apresenta-se como rei davidico, no mesmo dia em que entra em Jerusalém aclamado pela multidão, para dar cumprimento ás Escrituras. No templo finalmente comportou-se como quem tem autoridade e não quis dizer aos sacerdotes com que autoridade fazia aquilo.
Jesus permitiu a Pedro, em nome dos doze discípulos, confessasse que Ele era o Cristo (isto é, o Messias) mas seguidamente proibiu falar desta realidade porque uma semelhante profissão de fé era muito imperfeita, e Jesus pensava já no seu desenlace final e na sua morte. De facto Jesus não se apresenta como um Senhor mas sim como servo, como um homem submetido à escravidão.
Jesus comporta-se e fala de tal maneira, como se nunca quisesse revelar o segredo - ou melhor ainda - o mistério da sua pessoa, porque os homens não poderiam compreende-lo ainda; segundo o quarto Evangelho, Jesus só disse aquilo que os seus discípulos podiam entender.
Jesus insinua muitas coisas que depois, com a ajuda do Espirito Santo, apareceram claras. Assim na Ultima Ceia, as palavras pronunciadas sobre o cálice parecem recordar a missão do servo sofredor que entrega a sua vida por muitos selando com o Seu sangue uma Nova Aliança.
Deus não só anunciou a sua vinda por meio de algumas pessoas humanas, mas também, contributos divinos, a saber: a Sua Palavra, o seu Espirito e a sua Sabedoria.. Contudo, Jesus apresenta-se falando em nome e com a autoridade do Pai, no Quarto Evangelho; e o Prólogo, onde é denominado "Logos", VERBUM-Palavra e nos Sinóticos: "Ouvistes o que foi dito, Eu porém digo-vos."
Noutra ocasião declara que Ele actua e fala pelo Espirito de Deus que Ele possui essa forca divina e que Ele a enviara sobre os seus discípulos.
Desse modo, coincidem em Jesus dois caminhos, um a partir de cima e outro a partir de baixo, com os quais Deus se tinha preparado, no Antigo Testamento, a sua vinda entre os homens. A partir de cima, os homens são chamados de uma forma cada vez mais próxima da Palavra de Deus, pelo seu Espirito e pela Sua sabedoria; a apartar de baixo, pois os rasgos cada vez melhor desenhados do Messias como Rei de Justiça e de Paz, Servo humilde e pacifico e Filho do Homem misterioso, surge e consegue eficazmente que os homens ascendam mediante eles até Deus. Por isso se abrem dois caminhos à Cristologia, num dos quais Deus se revela a si mesmo em Jesus Cristo, vindo entre os Homens e salvando-os, ao comunicar-lhes a sua própria vida; no outro, o género humano encontra em Cristo, como novo Adão, a vocação primigénia de filhos adoptivos de Deus.
JESUS E A SUA REVELAÇÃO COM DEUS
O mistério de Jesus encontra-se essencialmente na sua relação filial com Deus. De facto, Jesus chama a Deus de "ABBA" que quer dizer Pai, mas com um marcado acento de familiaridade, ou seja, alguém que lhe é muito próximo, do mesmo "sangue". É uma relação tão filial que Jesus chega a pronunciar: "tudo me foi entregue por meu Pai; ninguém conhece o Filho senão o Pai, como ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar".
Jesus tem a consciência desde muito cedo, que a sua vida é dedicada a vontade do Pai. Esta condição de Filho não lhe impede, contudo, ser perfeitamente um homem, que crescia em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Seus e dos Homens.
A PESSOA DE JESUS - ORIGEM DA CRISTOLOGIA
Todos os "títulos", milagres, funções e mediações referidas à salvação, que já se indicavam nas Sagradas Escrituras, reconhecemos-las assumidas e concentradas na pessoa de Jesus. Mas foi necessário que aqueles que acreditaram nele, interpretassem de um modo inteiramente novo.
Na verdade, foi inesperada a forma como o reino do Messias (isto é, de Cristo) chegou por meio do escândalo da Cruz, depois de Jesus sofrer a morte como "servo" fiel e pela sua ressurreição entrar na gloria do FILHO DO HOMEM. Esta é a forma como chegou a se reconhecido como Cristo, Filho de David, e também Filho. seus em poder. Palavra, Filho de Deus, Cordeiro de Deus, sacrificada e glorificado, testemunho fiel e Pastor verdadeiro. Mediador da Nova Aliança desempenhando o seu sacerdócio real e finalmente, além disso, O PRIMEIRO E O ULTIMO, que no Antigo Testamento era um título pertencente só a Deus. Assim, se cumpriram as Sagradas Escrituras plenamente em Jesus de um modo diferente e melhor do que esperava Israel. Mas isso só pode ser captado por um ato de fé, com o qual confessamos que Ele é o Messias, Senhor e Filho de Deus.
A ORIGEM DA FÉ EM JESUS CRISTO
A Luz da Páscoa
A fé dos discípulos de Jesus, ainda que tivessem acreditado nele há algum tempo, permaneceu imperfeita enquanto Ele viveu. Mais ainda, com a sua morte foi profundamente sacudida, como atestam os Evangelhos. Mas tornou-se clara e plena quando Deus o ressuscitou e lhe concedeu fazer-se visível para os seus discípulos. As aparições com as quais Jesus se mostrou vivo depois da sua paixão e deu-lhes disso numerosas provas, de nenhum modo eram esperadas pelos seus discípulos, de forma que só com muitas vacilações reconheceram a verdade da sua ressurreição.
Com a Luz resplandecente da Páscoa, algumas palavras de Jesus, que antes tinham parecido difíceis, tornaram-se claras como os seus gestos também. Sobretudo a sua paixão e a sua morte deixaram ver toda a sua significação, desde o momento em que lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras. Deste modo se constituíram as testemunhas e as suas palavras se converteram no fundamento sobre o qual se apoia a fé da comunidade primitiva. Pelo seu testemunho, podia-se entender tudo o que foi escrito de Jesus na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos, e ao mesmo tempo, podia-se discernir de que modo se cumpririam nele as promessas de Deus.
Estas aparições , ao mesmo tempo, ilustraram também o significado daqueles acontecimentos que eram consequência da sua ressurreição: o dom do Espirito Santo, concedido já na tarde da Páscoa, segundo o quarto Evangelho, a vinda do mesmo Espirito sobre os discípulos no dia do Pentecostes, os milagres de curas realizados em nome de Jesus. Desde então, o centro da fē apostólica foi não só o Reino de Deus, cuja chegada Jesus tinha anunciado, mas também o próprio Jesus, em quem tinha começado este Reino.
O CRISTO TOTAL, META DE TODAS AS COISAS
A salvação trazida por Cristo é total. Chega aos homens até ao seu próprio corpo, pela graça do baptismo, da Eucaristia e dos outros sacramentos. A Santidade de Cristo, que se comunica à Igreja, difunde-se assim, na vida dos Cristãos, de modo que por eles pertence ao mundo no qual vivem a sua vida. À imitação do seu irmão Primogénito (Jesus), eles próprios se fazem participantes da edificação do Reino de Deus, que Cristo veio instaurar entre os homens, expondo o seu programa de paz, amor e justiça. Segundo o exemplo dado pelo Mestre, também eles devem dar a vida pelos irmãos.
Posto que Jesus foi enviado a anunciar a Boa-Nova aos pobres, a libertação dos cativos e a mandar em liberdade os oprimidos, os seus discípulos devem preocupar-se em continuar esta obra de libertação. Assim, a sua Igreja prepara a vinda definitiva do reino de Cristo, no qual Ele próprio, uma vez submetidas todas as coisas a si, se submeterá a seu Pai, a fim de que Deus seja tudo em todos.
Para alcançar esta meta, a Igreja já se encontra inserida no mundo, pelos seus membros. Não lhes manda deixar este mundo; por meio deles, trabalha para que o espirito do Evangelho possa penetrar em todas as estruturas familiares, sociais e políticas. Assim, Cristo presente nos assuntos deste mundo, difunde neles a graça da sua salvação.
Posto isto não pode ser realizado sem esforço e sem dor. O pecado, que entrou neste mundo desde o começo, continua a produzir no mundo maus frutos. O Reino de Deus, apesar de já ter começado, ainda não se manifestou plenamente, mas progride paulatinamente entre dores como as do parto. A própria criatura, ainda que submetida pela vaidade, espera a libertação da escravidão da corrupção. Mas Cristo triunfou sobre o pecado pela sua morte e ressuscitando, venceu o dominador deste mundo. Portanto, os Cristãos, seguindo o seu exemplo e sustentados pela sua graça, devem lutar e sofrer, se for necessário, até ao martírio para que o bem triunfe sobre o mal até que cheguem os novos céus e a nova terra onde habite a justiça.
Então será reconhecido, amado, adorado e recebera o culto de todos os homens, convertidos em seus filhos adoptivos. Assim se completará a sua obra de salvação na eternidade bem-aventurada, que Ele, com a sua misericórdia, fidelidade e paciência inesgotável continua, desde o primeiro chamamento, do qual a humanidade se afastou - até ao dia em que todos, gozando de uma felicidade sem fim, o aclamarão.